Entrevista Marcos Alberto da Silva Pinto
Entrevista concedida por Marcos Alberto da Silva Pinto em 1999 a alunos de Psicologia da Universidade Capital (São Paulo/SP).
Ética na Psicologia ClÃnica
Por: Nielson Brites D’amaral e CecÃlia Pera.
GRUPO: Por que escolheu a Abordagem Centrada na Pessoa?
MARCOS: Quando estava na universidade durante um trabalho na matéria “Dinâmica de Grupo’, tive que entrevistar um profissional que tinha como referência a Abordagem Centrada na Pessoa. Como havia tido um professor no ano anterior que tinha a ACP como referência, fui entrevistá-lo e me interessei pelo que ouvi.
A princÃpio, me interessei pela não diretividade, pela flexibilidade. Gostei da idéia de olhar a pessoa ao invés das regras e das propostas pré-estabelecidas.
GRUPO: Você atende as pessoas de forma individual ou em grupo?
MARCOS: No consultório atendo tanto em grupo quanto individualmente. Trabalho ainda com Grupos de Encontro, que é um trabalho realizado em um final de semana com no máximo 18 pessoas.
GRUPO: Como você trabalha com a ética no trabalho em grupo?
MARCOS: Para se falar de ética, primeiro eu quero tocar em alguns pontos: Tem a ética formal, que o próprio CRP nos fornece e que aprendemos na universidade. No entanto, ética pra mim, vai mais além.
Em minha opinião, tendo como referência a ACP, a ética é também o bom senso e o respeito aos princÃpios desta abordagem.
O respeito ao cliente, o respeito consigo próprio, a atenção e o respeito aos próprios limites. Saber olhar o outro e respeitar a sua direção, sendo apenas um facilitador no processo do outro.
Na minha visão, não me parece ético, o direcionamento ou a imposição do psicoterapeuta, na medida em que tiro do outro a condição básica dele ser e escolher o seu próprio caminho.
Pra mim, não é ético atender uma pessoa oprimida de acordo com a necessidade do opressor, atender o outro com uma opinião já formada ou acatando o rótulo imposto ainda que isto tenha o aval da sociedade ou de princÃpios pré estabelecidos.
Existe ainda a questão do sigilo, que principalmente em um grupo, deve ser sempre lembrado.
Eu sinto a necessidade sempre antes do inÃcio de cada Grupo de Encontro falar um pouco da importância e da necessidade do sigilo de um grupo naquilo que é dito ou vivenciado.
GRUPO: De acordo com a sua experiência a ética é respeitada em um grupo?
MARCOS: Hoje, depois de nove anos, eu sito a necessidade de deixar mais claro a questão de sigilo em um Grupo.
Antes, algumas poucas vezes, até por ingenuidade, pelo outro achar que determinado assunto não tinha importância a pessoa acabava contando algo do outro depois do grupo. Muitas vezes até para elogiar ou convidar alguém a participar de um próximo Encontro.
Eu nunca percebi em nenhuma situação, maldade das pessoas, no entanto senti a necessidade de falar mais claramente da importância e da responsabilidade do sigilo.
De todo modo, não quero e nem há uma forma de se controlar para que isto nunca aconteça. Como tudo na vida, há sempre um risco.
GRUPO: Nas vezes em que isto ocorreu, foi, de alguma forma, trabalhado com o grupo?
MARCOS: Em grupo, no consultório isto nunca ocorreu. Em Grupos de Encontro, como disse, eu não gostaria e não dá para se ter o controle. O que eu posso fazer é tentar criar condições para que o outro se conscientize da importância do sigilo como um compromisso ético do grupo. Que todos nós somos responsáveis pelo grupo e pelo respeito ao outro através do sigilo.
GRUPO: Como você sente o trabalho de consultório hoje, neste perÃodo de crise econômica?
MARCOS: Não houve, pra mim, uma diminuição do número de atendimentos nem de procura por psicoterapia.
Na minha vivência, o que tem acontecido é um número muito grande de pessoas desempregadas ou que tiveram uma grande queda no seu poder aquisitivo.
Procuro sempre deixar aberto com as pessoas que atendo ou vou iniciar o atendimento a questão do valor.
Eu me sinto bem dando o direito e a oportunidade da pessoa se expressar quanto a sua condição financeira, e levar em conta a situação da pessoa.
Ser flexÃvel, entendendo e aceitando a condição do outro, inclusive no aspecto financeiro, em minha opinião é algo imprescindÃvel para se tentar ajudar alguém.
Esta é uma visão minha e que em minha opinião tem a ver também com ética.
Não me sentiria bem deixando de atender alguém em função da condição econômica da pessoa.
Pra mim, pagamento justo não é apenas aquele que eu cobro, mas sobretudo aquele que vai de encontro a condição do outro.
GRUPO: O que você pode dizer a nós alunos com relação a nossa futura profissão?
MARCOS: Não dá pra ser psicólogo sem acreditar naquilo que se está fazendo. Não dá pra acreditar sem conhecer e se aprofundar.
Eu, como estudante, tinha uma base na universidade, mas procurava participar o máximo possÃvel de eventos fora da universidade. Fazer terapia, cursos…
Pra eu descobrir com o que eu me identifico, é preciso que eu conheça e participe.
Quando eu era estudante me desanimava ouvir da maioria dos professores que ninguém vive da psicologia clÃnica, que a psicologia clÃnica pode ser uma segunda atividade, mas que o profissional deveria trabalhar em alguma outra atividade para poder sobreviver.
Ainda bem que eu não acreditei nisso e fui comprovar por mim mesmo, pois eu pude constatar de outra forma e viver apenas da psicologia clÃnica.
Se você investir, conhecer, acreditar, for flexÃvel, saber ouvir e aceitar crÃticas e procurar aprender com elas e com a própria experiência, na minha opinião é pouco provável que não dê certo.
Depois de nove anos trabalhando como psicoterapeuta, posso dizer que as pessoas que eu conheço que investiram de corpo e alma na profissão de alguma forma estão indo adiante.
Em contra partida aquelas que acreditaram naquilo que ouviram sem procurar comprovar por si, não foram adiante.
* Marcos Alberto da Silva Pinto é Psicólogo e psicoterapeuta individual e de grupo.
FONTE: VÃdeo apresentado à disciplina de Ética Profissional da Faculdade de Psicologia da Universidade Capital (São Paulo/SP) pelos alunos Nielson Brites D’amaral e CecÃlia Pera em 1999.