Esther Gomes de Lima Carrenho
*Texto escrito em 2002.
A maioria das pessoas quando se inscrevem pela primeira vez num Grupo de Encontro perguntam: “Qual é o programa do fim de semana?”
Confesso que gasto muito mais tempo para responder e tentar explicar que não há um programa do que se simplesmente apresentasse um esquema com horários e atividades especificas.
O programa do Grupo de Encontro é feito pelo próprio grupo. Não numa reunião em volta de uma mesa com caneta e papel na mão. Não numa troca de idéias considerando a melhor forma de gastar o tempo, mas numa tentativa de experimentar olhar profundo para dentro de si mesmo, no contato consigo e com o outro. Diante disto talvez podemos dizer que não há programa mas há um caminho a percorrer e este caminho é o próprio grupo que determina. Mas a determinação na verdade é apenas a de ir pelo que surge, com medo, sem saber o que vem pela frente. É um salto no novo e no desconhecido. Nem sempre o que acontece é o melhor, mas com certeza não será nem o errado e nem o certo. É o que é. E fará parte do processo de crescer e o próprio grupo encontrará a melhor forma para as mudanças, se houver necessidades delas. Rogers usa um fato que ilustra bem esta verdade:
“Um grupo, para mim, é semelhante a um organismo, possuindo o sentido da própria direção, ainda que não possa definir intelectualmente esta direção. Isto me recorda um filme médico que há tempos, me causou profunda impressão. Era um foto-microfilme que mostrava os glóbulos brancos do sangue movendo-se inteiramente ao acaso na corrente sanguínea, até que apareceu uma bactéria patogênica. Então de uma maneira que só podia ser descrita como propositada, dirigiram-se para ela. Rodearam-na e gradualmente, cercaram-na e destruíram-na. Depois voltaram para o seu caminho…De igual modo segundo me parece, o grupo reconhece no seu processo os elementos não saudáveis, centra-se neles, filtra-os ou elimina-os, e continua, tornando-se num grupo mais saudável.”(Rogers, Carl R. – Grupos de Encontro, pag. 52).
É assim também para os psicoterapeutas. Quando vamos para um Grupo levamos na bagagem toda a nossa vivencia como pessoa, toda nossa experiência como facilitadores de grupos, todo nosso conhecimento e toda nossa disposição para dar o melhor de nós mesmos, mas principalmente vamos cheios de expectativas pela surpresa de qual caminho vamos trilhar e do que vai acontecer.
Qual então a função do psicoterapeuta?
A função do profissional aqui é:
·Em primeiro lugar proporcionar um ambiente, onde haja uma facilitação para o contato da pessoa consigo mesma.
·Em segundo lugar é caminhar junto no caminho escolhido pelo grupo. Como psicoterapeuta até é possível indicar um procedimento ou uma conduta sempre dando liberdade para que o grupo concorde ou não, mas os resultados e como aproveitar o que foi proposto é sempre com os participantes do mesmo.
·Em terceiro oferecer ferramentas que possam ajudar não só o grupo, mas cada participante do grupo, neste caminhar para se encontrar da forma mais profunda e verdadeira possível.
Como terapeutas não fazemos o programa, não escolhemos o caminho mas vamos juntos como participantes, não ignorando nossos próprios sentimentos; como facilitadores criando um clima que transmita segurança e oferecendo suporte e encorajamento para aqueles que quiserem correr o risco de mergulhar no até então desconhecido e conhecer mais da sua própria realidade. Entendo que quando a pessoa encontra um ambiente onde o que for dito será respeitado e aceito como uma expressão da sua verdade, ela terá mais liberdade para se expor , desnudando-se e percebendo se a realidade ali exposta faz parte da sua essência ou eram apenas situações internalizadas que não fazem sentido no seu viver. Pior ainda, além de não fazerem sentidos, são dinâmicas adquiridas ou impostas que trazem aprisionamento e sofrimento. Na exposição à pessoa tem a oportunidade de fazer contato consigo mesmo e no acolhimento ela pode experimentar a aceitação de si mesma se fortalecendo para se tornar cada vez mais autêntica e integrada em todos seus relacionamentos, inclusive consigo mesma.
Permitir que o grupo encontre seu melhor caminho significa acreditar que esta é a melhor forma de tratarmos com o que é mais emergente e importante para o grupo e para cada um dos seus participantes. Não estou invalidando as dinâmicas e vivências preparadas por antecipação. Apenas, entendo que quando o programa é planejado apenas pelos profissionais que estão na função de psicoterapeutas a possibilidade do participante entrar e sair sem um contato profundo com a sua real necessidade é maior. Não esquematizar um programa também não significa que o psicoterapeuta é omisso e desprovido da capacidade de usar qualquer técnica quando for necessário e de forma espontânea. Todo o grupo pode participar de uma forma terapêutica mas cabe ao facilitador promover os recursos disponíveis para um movimento terapêutico do grupo. Isto significa que qualquer conduta usada de forma espontânea e democrática, respeitando o caminho que o grupo escolheu é proveitosa.
Desta forma, o programa do Grupo de Encontro pode ser você. Desde que você queira experimentar!